sexta-feira, 8 de junho de 2012

Eles nunca entendem...


Quando vi a primeira notícia sobre a Femen por estas paragens, vi logo que, para variar, o movimento das ucranianas seria visto como algo sensacionalista (para não dizer espalhafatoso) e figuraria quase sempre ao lado de notícias de fofocas ou das gostosas de carteirinha que batem ponto nos nossos grandes portais. Ainda que tenha visto uma entrevista delas há alguns dias no SporTV, na qual a presidente da organização explica a estrutura da sociedade ucraniana, tão ou mais opressora que a nossa em relação às mulheres, e por mais que tenha achado as palavras dela ótimas em suas colocações, é risível ver como o repórter da emissora, na edição, só tenha preocupado-se com a nudez delas.
Elas entendem que eles, os homens (vá lá, eu tenho de incluir-me a contragosto nesse rol), não entendem. A nudez é uma afronta aos homens, que permitem-se ficar sem camisa, mijar nas ruas, mas jamais podem admitir que uma mulher use a sua nudez para protestar. Afinal, é despropositado, quando elas poderiam estar engrossando o coro das desempregadas do Leste Europeu que se prostituem ou tornam-se atrizes pornôs. Afinal, elas compreendem que a Eurocopa (como a Copa do Mundo que acontecerá aqui) é um evento para poucos endinheirados - geralmente homens, claro - nos quais os aspectos culturais dos países visitados é algo dispensável. Por que eu iria visitar os campos de concentração de Auschwitz (a Eurocopa, pela terceira vez, será realizada em sedes duplas, neste caso Polônia e Ucrânia), ou os museus ucranianos que falam das atrocidades cometidas pelos nazistas em seu território durante a Segunda Guerra, quando posso estar ao lado de uma linda polonesa ou de um monte de jovens ucranianas que topariam tudo para ter uma graninha a mais? 
Segundo a presidente da Femen, as mulheres ucranianas são impelidas a casarem-se cedo, a não estudarem, a não terem uma carreira, para que sustentem a ideia do macho-provedor tão cara aos homens de lá. As que não se submetem isso têm de aceitar salários 30% menores do que os dos homens (parece um país que conhecemos, não?), sem contar as piadinhas e outros epítetos (vadia é um deles) lançados pelos caras de lá.
Elas entendem que os homens só compreendem o corpo feminino com um fetiche ambulante, e não duvido que elas escolheriam outro caminho (por mais livre que uma mulher seja, expor o corpo - e um corpo é só um corpo-, fugir da exposição a um monte de idiotas seria o ideal), mas quem iria prestar atenção a um monte de mulheres gritando vestidas? Se só há essa alternativa, que a usemos. 
O triste nisso tudo é que as ideias que elas passam acabam sendo deixadas para trás e o conceito de que muitos caras têm delas (até os "esclarecidos") é de apelonas, que aquilo é dispensável, etc etc etc. 
Eles nunca entendem... Até porque, no íntimo, estão mais preocupados em observar quem é que tem o rosto mais bonito, os seios mais durinhos... Perceber e topar a parada, sem preconceitos, é jogar fora todo o imaginário acerca do corpo feminino, algo que deve estar "disponível" apenas nos menus habituais, seja a cama, seja a revista masculina, seja na propaganda sensual ou no filme pornô. É complicado para um homem médio, que dirá os pequenos, imaginar aquele corpo como algo rigorosamente igual ao seu em seu estatuto de corpo. Por mais que seja diferente, é só um corpo, e a dona desse corpo tem o direito de fazer o que bem entender dele.
Não, eles nunca entenderão...

2 comentários:

  1. É a banalização do protesto e também da nudez. Eu acredito que todo protesto precisa causar uma ruptura. Hoje a nudez tem sido usada para protesto por causa dos motivos que você apontou, muito acertadamente, por sinal, mas se por um lado tentar romper porque o corpo feminino é ainda visto como algo a ser coberto, entre uma indecisão se ele é sagrado ou profano, e sobretudo, propriedade do desejo e imaginário masculino, por outro, já virou uma banalização: "essas ucranianas estão tirando a roupa pelo que agora?"

    Eu acredito que é preciso sempre repensar e pensar as próprias atitudes, inclusive a do protesto. De repente se todas saíssem usando um terno agora rompesse mais que a nudez.

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  2. Irei usar as sábias palavras da nossa colega de blog que também já escreveu algo sobre as tais ucranianas:

    "quando você quer chamar a atenção de pessoas para uma causa, você não tem que apenas passar uma mensagem, você tem que passar a mensagem de forma que o receptor compreenda..." (Ana B.)

    O q também não é nada fácil.

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