sábado, 13 de outubro de 2012

Poder de Polícia, Igreja e a Questão Indígena




A questão indígena na América Latina ainda apresenta muitos pontos irresolvíveis ao longo desses 420 anos que serão lembrados (e não comemorados) no dia 12 de outubro próximo. São muitos também os autores desta parte do continente que “insistem” em denunciar esta guerra preterida por nossa sociedade atual, cujas chagas não conseguem uma cicatrização final.

Em palestras e em alguns artigos costumo dizer que ainda que faltasse tinta aos primeiros escribas europeus que relatavam a “Conquista”, sobrariam os sangues ainda não-coagulados dos povos que aqui viviam.
Um dos primeiros relatos, senão o primeiro, a expor as atrocidades do massacre aplicado pelos espanhóis como um pecado são do Frei Bartolomé de Las Casas em sua “Brevísima Relación de la Destruición de las Indias (ocidentais)” de 1552. Ante seu credo, via inimaginável a selvageria dos seus... cristãos, ante um povo que lhes recebera de modo cordial e, inclusive, amável.

Na quinta-feira, dia 4, no departamento de Totonicapán, na Guatemala, as mortes de seis indígenas que, segundo membros da imprensa, foram atacados gravemente por policiais, é mais um capítulo, ou página do que seguidamente vem sendo nossa história. Muito embora haja uma evolução no campo político e social, como as tentativas da poetisa e ativista Rigoberta Menchú (Nobel da Paz) à presidência, ainda se persiste o objetivo da assimilação do índio ao padrão europeu. Essa assimilação ou “civilização” do indígena reforça tão-somente a falácia, uma vez que o verdadeiro sentimento é que os índios, se não morrerem, sejam escravizados, segregados e explorados. A igreja pede justiça e condenação.

A questão do sentir/pensar/agir pode ser inferida da obra de outro exímio guatemalteco, ninguém menos que Miguel Ángel Asturias, principalmente em seus romances “Vento Forte”, “O Papa Verde” e “Os Olhos dos Enterrados”, obras que fazem parte de sua Trilogia da Banana. Nelas não há somente a questão indígena histórica, mas os sintomas e também sequelas de uma sociedade mestiça ainda sob o jugo de um totalitarismo travestido de democracia. O Nobel da Literatura de 1967 nos mostra como o discurso distorcido do “pensar” de um governante, líder ou empresário – que se remete a qualquer ser humano – pode elucidar o sentimento real sobre um tema materializado em suas ações.

Ou seja, continuamos a maquiar a questão indígena quando temos notícias infelizmente comuns, como esta, em nosso, continente.

Quanto à questão indígena no Brasil e para ficarmos somente em um romance, temos “Quarup”, de Antônio Callado. Mediante seu personagem Fontoura, ávido funcionário do Serviço de Proteção ao Índio, fica marcante um sentimento sobre a questão dos índios do então futuro Parque do Xingu. Com um pouco de cachaça na mente, coisa que faz aflorar seu discurso sem censura, sugere, com o artifício do humor, mas com seriedade, que para entenderem o drama indígena seria interessante aterrissar na (então) capital federal, o Rio de Janeiro, uns vinte aviões com todos os índios armados e invadindo as praias, a Rio Branco. “Aí sim seria mais honesto verem a polícia ou o exército matando os índios a tiros em vez de matá-los de fome”.

OBS: Este texto super bacana é do Thiago Quintella de Mattos, que é leitor do Manchete de Ontem desde o início do blog, e agora escreve com a gente!  \o/

7 comentários:

  1. Parabéns ao texto achei interessantíssimo.
    Acho um pecado a interferência dos homens civilizados aos indígenas na verdade acho que deveriam ficar protegidos e intocados para que podessem manter sua cultura, se não fosse o pequeno fato de quem mora no Norte e no Pará se deparar a todo instante com indígenas de Hilux, bebendo nos bares e causando medo na população, Índio que mata não vai preso, são protegidos pela FUNAI a culpa não é deles é do próprio cidadão civilizado e sua mania de interferir no que deveria ser deixado livre e intocado.

    Alguns amigos viajaram para o Pará para trabalharem na construção de uma empresa e semana passada me ligou totalmente assustado por ter que sair as pressas de onde trabalhava, por ter 5 mil indios armados destruindo tudo e ameaçando quem trabalhava nesta empresa, mesmo após os índios terem ganhando 300 picaps zeradas para ficarem conformados, e mesmo a empresa não está sendo construída em reserva indígena mas ambiental apenas, em vista da aliança que fizeram com os fazendeiros também chateados com o fato desta empresa não sei de onde vieram as armas, mas sinceramente acho um tanto hipócrita essa questão indígena no Brasil.

    pode ser que na Guatamela seja diferente, mas no Brasil quem está presente e convive com os índios presencia muito disso.

    As atrocidades do passado, a intensa interferência "civil" e o pior "estatal" está fazendo de nossos índios serem um tanto capitalista e sem consciência, sou muito contra isso, e meu desejo é que realmente eles ficassem protegidos em suas aldeias com a minima interferência possível, isso não inclui Hilux, armas e Internet que é ouço falar.



    ResponderExcluir
  2. Uau Sara! Um comentário que é um grande artigo. Pegou exatamente o grande problema da questão indígena no Brasil. Na América central e na Andina é bem mais séria e forte a identidade indígena. Mas a FUNAI já decepcionou muitos de seus funcionários, que ainda lutam, mas saem muito desiludidos. Um problema que, como o artigo menciona, vêm desde de Getúlio, quando falamos no âmbito estatal. Muito obrigado.

    ResponderExcluir
  3. eu sou meia leiga quanto a isso Thiago de história do brasil, mas achei legal vc ter tocado neste assunto, quando meu amigo me ligou e me contou isso, fiquei revoltada e pensando, como que 5 mil índios armados lutando por terra, como que índios recebendo 300 picaps e isso não vai pra rede globo?

    Aí que tá o problema, grandes empresas grandes negócios, ninguém quer levar isso a conhecimento das pessoas, rola muita grana, muita treta...raramente vemos isso no noticiário de grande circulação...

    O norte é esquecido e excluído assim como os índios, são grandes desmatamentos, praticamente guerrilhas armadas rolando mas ninguém sabe de nada, eu soube por causa dos meus amigos que estão trabalhando lá senão passaria batido.

    È fato, no Pará a grana rola solta, a matança, ainda existem os coronéis, jagunços, pistoleiros, grande parte da minha família mora lá, é muito tenso.

    ResponderExcluir
  4. A FUNAI é um órgão de proteção mas é muito difícil lutar por algo onde o dinheiro, os fazendeiros, as grandes empresas mandam mais que a lei.

    ResponderExcluir
  5. Segundo meu amigo a polícia quando acionada chega e apenas fica assistindo tudo, eles quebrando tudo, pois eles não podem fazer nada, os índios são de responsabilidade apenas da FUNAI.

    mas vc acha mesmo que os fazendeiro não passa fogo nos monte anrram...desculpa p linguajar informal, é o uso excessivo de internet, mas é mais ou menos por aí.

    ResponderExcluir
  6. Pois é, Sara. O Norte e o Nordeste fazem do Velho-Oeste norte-americano um simples cabo-de-guerra ou queda de braço. Toda e qualquer política de revitalização, melhora ou qualquer desenvolvimento voltado para a população e para a preservação do ambiente, esbarra sempre no maior câncer de nosso continente: a ganância dos posseiros e invasores, em âmbito internacional e nacional. Euclides da Cunha em Os Sertões e Peru vs. Bolívia, nos dá a noção de quando isso tudo começou.

    ResponderExcluir