quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Relacionamentos digitais que acabam mal

 
Essa semana eu estive presa a um livro. “Capitães da Areia” de Jorge Amado fala sobre o cotidiano de crianças de rua que furtam para viver. Durante o livro todo há momentos mostrando o quanto esses meninos buscam um carinho, um afeto, e conseguem algum ao brincarem juntos, dormirem com mulheres ou entre eles mesmo, brincando com um animal na rua... Duas passagens ocorrem com o mesmo personagem: em uma o personagem se finge de coitado para dormir na casa de uma família rica, descobrir tudo sobre a casa e depois voltar com seus companheiros para roubar tudo, porém a família tinha perdido o filho, e resolveu adotar o ladrãzinho. Em outra o personagem faz o mesmo truque na casa de uma solteirona rica, que abusa sexualmente dele. No fim do livro o menino, já crescidinho, sente que ninguém o amou de verdade, pois a família rica só o via como o filho morto que voltou à vida, e a solteirona só queria alguma atenção, em nenhum dos casos o amaram de verdade.
 
Mas eu não estou aqui para falar do livro. Durante o livro vi várias vezes a busca por carinho dos personagens. E quem irá dizer que essa é uma obra somente de ficção, e que nunca é assim na vida real? Já se perguntou porque adolescentes sofrem tanto querendo fazer parte de um grupo? Eles sofrem muito querendo fazer parte de um grupo pois precisam de alguma atenção, de alguma acolhida, de pessoas. É clichê, mas nenhum ser humano consegue viver sozinho. Eu mesmo já tentei, e não tive sucesso.
 
O que isso tem a ver com a notícia? Muitas pessoas não conseguem o afeto e atenção na vida real e buscam na web alguém para lhe dizer coisas boas. Há quem só viva de contatos virtuais, e não se preocupam as com pessoas à sua volta. Isso ainda não é um problema, ainda.
 
Qual o problema então? O problema é quando a pessoa que esta desesperada na busca de afeto desliga seu sentido de medo, de cautela. “Na internet ninguém se conhece, ninguém saberá quem eu sou”, essa frase é um engano, há como “seguir” uma pessoa e descobrir detalhes sobre sua vida, e não estou falando somente do twitter, mas qualquer marca digital deixada na web. Já me deparei  com uma pessoa que tinha uma foto minha e eu nem sabia da existência daquela foto, e nem que a pessoa soubesse algo sobre mim. E com a “moda” de se expor cada vez mais, é muito mais fácil de se surpreender com o número de pessoas que sabem muito sobre você, ou onde mora, ou seus hábitos. Esse é o primeiro ponto onde se deve ter cuidado.

O segundo ponto é a confiança. Já vi colegas que não confiam nem na mãe de repente colocarem a mão no fogo por um conhecido virtual. Confiança deve ser conquistada, e sem contar que, mesmo que você conheça muito sobre a outra pessoa, como a sua cabeça consegue guardar tudo o que gera confiança e desconfiança sobre todas as pessoas do seu círculo virtual? Você se lembra qual dos seus conhecidos já te magoou? São tantos... como você pode confiar em todos eles? Seu cérebro sabe separar  todos os que não te fizeram mal? Se um trocar de “Nick” você ainda vai saber lidar com quem é quem e como te tratam, o que fazem, como são?

O pior de todos é o terceiro ponto: as pessoas que estão tão desesperadas que não enxergam quem pode te fazer bem e quem não pode. No desespero, ficam cegas, ou fingem ignorar os riscos. Como na história do livro que citei no inicio deste texto, a solteirona abusava do menino para conseguir migalhas de afeto, mesmo ignorando que o que lhe era trazido não era afeto verdadeiramente dito.

Nos expomos de uma forma alarmante na web. Uma vez li o tweet automático vindo do 4square de uma pessoa, e nele dizia que estava no banco, na rua X. Você pode achar que nenhum dos seus conhecidos irá te assaltar, mas essas informações estão disponíveis para qualquer um. Alguém poderia ir esperá-lo na saída do banco para um assalto, como aqueles que sempre existiram, mas que os assaltantes não escolhiam tanto suas vitimas.

Mas nem todos que estão na web são maus, não é isso que eu estou dizendo. Minha melhor amiga eu conheci pela web, há uns 6 anos. O problema é confiar em tudo, dar toda sua vida como um livro aberto, e o que é mais perigoso: começar um romance sem conhecer o suficiente a outra pessoa.
 
Quando não conhecemos a outra pessoa, seja qual for o tipo de relação, não sabemos se ela nos fará mal, se será ciumenta, doentia, daquelas que matam por ciúmes, não sabemos de nada. E nessas e outras que ocorrem notícias como as que inspiraram esse post.

5 comentários:

  1. Eu não sei se a questão é carência, falta de bom senso, ou uma boa mistura dos dois!

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  2. Antes mesmo de ler quero parabenizar pelo uso dos parágrafos!! Linda estrutura, tava faltando no blog!

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  3. Acho q a internet só veio aflorar ainda mais o lado carente e inofensivo de algumas pessoas, como consequencia facilitou a busca de vitimas por tarados, aproveitadores e essa bandidagem em geral.

    Precisa-se de mais psicologos no mundo! E atendimento psicológico no SUS. Problemas com drogas, alcoolismo e pedofilia estariam sendo melhor monitorados e tratados!

    Psicólogos cadê vcs?

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  4. eu nunca consigo colocar parágrafos, o blogger n deixa =(

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  5. Reflexão apropriadíssima! Tenho a mesma percepções semelhantes quanto a esse assunto. Vivemos na era da carência absoluta. E, consequentemente, na era do bom senso zero.

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