Manchete de Ontem: A luta do pai pela vida de Vitor.
Minha ajudante vive me
aconselhando a visitar a Vila
São Cottolengo, um lugar muito bacana que faz um trabalho muito
bonito, mas eu me recuso. Eu faço minhas doações, vou até a
porta, mas não entro. O motivo? O pessoal que é ajudado pela Vila
São Cottolengo é feliz, eles tem uma vida bacana graças ao
trabalho e o empenho de quem se doa pelos outros, e eu vou chorar
após 10 minutos no local. Aí me falam que eu devo ir pra perceber
“o quanto minha vida é boa”. Oi? Eu vou usar aquelas pessoas pra
me sentir melhor? Eu sei que minha vida é bacana, relativamente
fácil. Eu agradeço a Deus e aos meus pais por isso. Eu espero
amadurecer ao longo dos anos, me tornar uma pessoa mais centrada e
mais forte, e conseguir fazer algo pelos outros além de mandar
dinheiro, roupas e cia... Mas por enquanto, eu não consigo. E essas
pessoas não precisam da minha pena, do meu choro, da minha
instabilidade emocional. Quando você visita um asilo, um orfanato,
uma creche de crianças carentes, você tem que levar alegria e
deixar seu sofrimento em casa.
Minha mãe teve
suspeita de câncer há alguns anos atrás... Era apenas gordura no
fígado. Na maratona que passamos no Hospital do Câncer, nas
clínicas, no consultório médico, eu era a chorona que não podia
ver uma criança carequinha, ou uma pessoa triste, se sentindo
cansada, diante de funcionários esgotados e endurecidos pelo tempo,
que já não facilitavam a vida de ninguém... Uma coisa bacana: vez
ou outra apareciam alguns voluntários, levando cafezinho e uma boa
prosa pra quem estivesse esperando o momento massacrante da consulta
ou do exame. Eles não estavam lá pra se sentir melhor diante do
sofrimento alheio... Eles estavam lá dividindo a alegria deles,
oferecendo um pouco de otimismo, tentando fazer bem.
Há quem consiga fazer
isso naturalmente, há quem tenha luz própria, encanto e otimismo
pra dar e vender. Eu, infelizmente, não sou dessas. Eu leio uma
história como essa da notícia em anexo, e choro. Nesse caso, ainda
caberia chorar, querendo ou não, o pai já superou a pior parte, já
lutou e venceu... É uma coisa bonita de se ler. Mas imagina o cara ao
longo da caminhada, recebendo visita de gente que usa a história
dele pra se sentir melhor? Francamente... Não é altruísmo nem
sensibilidade se você usa a situação de forma egoísta, pra
aprender amar sua vida, pra fazer publicidade, pra bancar o bom
samaritano...
Cada um conhece seus
motivos, suas razões... Eu conheço os meus. Não gosto de ser
egoísta porque não foi isso que meus pais me ensinaram, não são
esses os valores que tenho. Fico chateada comigo por ter todas essas
limitações emocionais que me fazem manter uma certa distância de
algumas situações. Mas aprendi que a gente faz coisas boas pra
agradecer pelas coisas boas que foram feitas por nós... A gente doa,
porque a gente tem. Porque se a gente se acomodar, vai sempre gastar
tudo o que tiver em futilidades, enquanto outras pessoas precisam do
básico. A gente faz visitas quando a gente pode levar algo bom,
quando a gente consegue dar algum suporte, quando a gente pode suprir
alguma carência, quando a gente tem alguma coisa pra oferecer. E a
gente dá lição de moral, quando a gente tem moral.
Eu realmente não me
sinto dona de alguma razão ou moral, quando o assunto é voluntariado. Eu já
fui voluntária em uma creche na minha adolescência, foi o melhor
que fiz. Naquela época eu sabia ser feliz, sabia não chorar na
frente das criancinhas, mesmo quando os pais esqueciam de buscá-las
porque estavam ocupados demais jogando sinuca no boteco. Depois dos
18, amoleci demais. Em um orfanato, saí chorando, porque eu não
tinha todo o carinho que as crianças precisavam... E as menininhas
ficavam perguntando o dia em que eu iria voltar. Nunca mais tentei,
não me sinto forte pra tentar agora... E só vou tentar de novo,
quando eu conseguir levar alguma coisa além de instabilidade
emocional. Até lá, posso ouvir as lições de moral que os outros tem pra me dar... Desde que venham de gente que se doa por vocação, por altruísmo, e não de gente que o faz em causa própria.
Nenhum comentário:
Postar um comentário